O que é o tempo? Se ninguém pergunta isso, eu não me pergunto, eu o sei; mas se alguém me pergunta e eu quero explicar, eu não o sei mais.
(Agostinho de Hipona)

quarta-feira, 27 de novembro de 2013

Karl Marx, a História e a Revolução: como mudar o mundo?

      A Europa do século XIX chacoalhou os pilares do hemisfério ocidental, transformando a sociedade contemporânea de diferentes formas e em seus mais variados aspectos. Barricadas eram construídas e levantes violentos varriam as ruas de Paris, Londres e outras capitais. Explosões, tentativas de assassinato e fuzilamentos eram constantes nos grandes centros urbanos. No plano social, a tradicional classe aristocrática em face de uma burguesia industrial em ascensão encontrava-se em plena decadência. Já o sofrimento da classe trabalhadora aumentava a cada dia. Em compasso, a grande imprensa crescia, e com ela disputas políticas ferrenhas entre diferentes facções que das páginas dos periódicos concretizavam-se nas avenidas e parlamentos. Enfim, o sistema socioeconômico vigente que aos poucos tomava corpo e mostrava sua face brutal, começava a pôr em xeque a crença no progresso, na ciência e na industrialização.
      Partícipe notório neste contexto histórico conturbado, o filósofo, jornalista, economista e historiador alemão Karl Marx, imortalizou-se como o “teórico da revolução”. Sua vasta obra incomodou e parece incomodar muita gente até os nossos dias. Sendo o pai do socialismo científico e do materialismo histórico juntamente com seu colega, o filósofo e economista Friedrich Engels, o alemão revolucionou as ciências do homem e nossa própria maneira de pensar. Temido pelos conservadores, repudiado pela direita política e pelos donos do poder, suas ideias, mesmo de tempos em tempos reinterpretadas por estudiosos, sem contar os diversos partidos políticos de esquerda, permanecem como o principal ‘norte’ para compreendermos o capitalismo, a contemporaneidade, entre tantos outros impasses. Contudo, o que representa Marx atualmente? O que os historiadores marxistas pensam a seu respeito? Qual sua influência na História? Muitas são as questões que permeiam o marxismo, poucas responderemos com precisão.
      Foquemos em uma de suas mais famosas e instigantes obras: o Manifesto do Partido Comunista. Segundo Sílvio L. Sant’Anna, “desde que dois jovens filósofos alemães aceitaram a incumbência para elaboração do manifesto da Liga dos Comunistas de 1847, este panfleto político, escrito há mais de um século e meio passou a ser o espectro que ronda a humanidade, separando os que estão à sua esquerda dos que estão à sua direita”. No Manifesto os autores teorizam uma filosofia da História revolucionária, separando os exploradores dos explorados – a burguesia e o proletariado –, propondo uma transformação política, social e cultural sem precedentes.
      Para Marx, somente com o levante do operariado e por eles a “conquista do Estado”, a brutal dominação burguesa cessaria. “Mas a burguesia não forjou apenas as armas que lhe trarão a morte; produziu também os homens que empunharão essas armas – os operários modernos, os proletários”, afirma o Manifesto. Críticas modernas surgiram dos próprios marxistas, vide o historiador britânico Eric Hobsbawm, quando afirmou em sua obra Como Mudar o Mundo, que “O Manifesto é, naturalmente, um documento escrito para um determinado momento da História. Parte dele tornou-se obsoleta quase imediatamente – por exemplo, as táticas recomendadas aos comunistas na Alemanha, e que eles não puseram em prática durante a revolução de 1848 e depois dela. [...] No entanto, Marx e Engels tinham consciência de que o Manifesto continuava a ser um importante enunciado da análise que distingue seu comunismo de todos os demais projetos para a criação de uma sociedade melhor”.
      Comunismo. Comum a todos. Extinto todo resquício de dominação, a classe dominante estaria banhada com seu próprio sangue, e o vitorioso proletariado dissolveria a propriedade privada, os dogmas religiosos e os pilares do Estado burguês, redesenhando assim o destino do mundo. No raiar do século XX, empunhando foices e martelos, o gigantesco campesinato russo liderado por Vladimir Lênin e pelos bolcheviques depôs a monarquia czarista e seu último rei, Nicolau II. Para os seguidores de Marx a Revolução Russa de 1917 parecia o “início do fim do capitalismo”. O ideário comunista, no entanto, caiu por terra após a revolução. Para Cornelius Castoriadis, após este levante, “o marxismo tornou-se primeiro ideologia, enquanto dogma oficial dos poderes instituídos nos países ditos por antífrase ‘socialistas’, invocado por governos que visivelmente não encarnam o poder do proletariado e não são também mais ‘controlados’ por este do que qualquer governo burguês. [...] Mantendo assim o aparelho de Estado mais opressivo e mais rígido que se tem notícia”. Em suma, o “comunismo institucionalizado” distanciava-se do bom e velho Marx.
      O que homens sedentos pelo poder, vide Joseph Stálin, Mao Tsé-Tung, entre outros, fizeram dos escritos de Karl Marx e de sua vasta obra e teoria, marcaram a ferro e fogo a História do século passado. Contudo, não podemos renegá-lo. Como livrar-se de seu espectro? Como desvencilhar-se de seu pensamento e concepção de mundo se o sistema que a gerou prossegue viagem sem fim de um desejo a outro? O consumo desenfreado, a ambição de adquirir, as devastadoras crises financeiras e a dominação diária dos grandes bancos e impérios governamentais são hoje os pilares mantenedores do capital. A Revolução não morreu! Marx permanece vivo em seus livros! Basta reinterpretarmos suas ideias para o século XXI. Um século onde o capitalismo nos devora, sem dó nem piedade.

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