O que é o tempo? Se ninguém pergunta isso, eu não me pergunto, eu o sei; mas se alguém me pergunta e eu quero explicar, eu não o sei mais.
(Agostinho de Hipona)

domingo, 18 de maio de 2014

50 anos do Regime Militar Brasileiro: repressão, resistência e História.

   Há 50 anos a História brasileira dava uma guinada que transformaria para sempre a vida nacional, de seus sujeitos e sua estrutura. No dia 31 de Março de 1964 facções das Forças Armadas sustentadas por uma significativa parcela da sociedade brasileira (empresários, religiosos e uma tradicional classe-média urbana) e, não menos importante, financiados pelo governo dos Estados Unidos da América mediante a CIA e outros órgãos de segurança, destituíram o presidente democraticamente eleito João Goulart e instauraram um regime autoritário de direita. Um dia que duraria 21 anos.
   Goulart, presidente visionário que almejou transformar o país através das reformas de base (agrária, tributária, etc.), e diminuir as injustiças e desigualdades que assolavam o povo brasileiro, foi deposto sob o pretexto clichê de uma “ameaça comunista” – a instauração de um governo que tivesse como base ideológica o sistema e as ideias do filósofo alemão Karl Marx e de seus teóricos ao longo do tempo. Tal “espectro”, profetizou Marx em seu Manifesto, causaria em tempos futuros tamanho frenesi.  
   Tamanho “perigo” havia sido imposto no Leste Europeu, na China e por último em Cuba. Jamais no Brasil. Não com Goulart. Não em seu governo. Os ideais do presidente gaúcho eram outros.
   Se deixássemos à parte os interesses econômicos dos sujeitos por trás do golpe de 1964 e o espirito golpista, reacionário e conservador que permeou facções da sociedade brasileira durante todo século XX até aquele momento fatídico, todo o discurso do regime instaurado cairia por terra. Ao subirem no poder os militares, gradualmente, decretariam Atos Institucionais, dissolvendo a Constituição, o Congresso e as Casas Legislativas, instaurando a censura dos meios de comunicação e nas artes em geral e reprimindo o pensamento de esquerda (fosse ele comunista, socialista, trabalhista, etc.).
   Universidades foram violadas. Professores e alunos presos. Livros queimados. Com o aumento das desigualdades, das periferias e da corrupção, era perceptível que os sonhos de Goulart e suas reformas de base eram enterrados no mais fundo dos calabouços.
   O período em questão – onde o Exército Brasileiro usou e abusou dos métodos de tortura mais bárbaros e medonhos já conhecidos, de prisões arbitrárias, assassinatos e extinção das liberdades individuais – abriu brechas para grupos de guerrilha e de combate ao regime, influenciados pelos estudantes do Maio de 68 francês, resistissem nas sombras dos campos e cidades.  
   A música popular brasileira (MPB) também protestava tendo Chico Buarque, Geraldo Vandré, Milton Nascimento, entre outros, à frente das mais belas e calorosas canções de revolta. No exílio, políticos criavam teias de diálogo através de telegramas secretos e orquestravam a resistência e a oposição. Pensadores como Darcy Ribeiro e José Honório Rodrigues também não se calaram.
   Com o movimento das “Diretas Já!” nos anos 1980 e o desgaste do regime, de forma lenta e gradual, sentia-se soprar os ares da democracia. Hoje, ironicamente, se observa as permanências do regime militar em diversos âmbitos do Estado brasileiro, da Justiça à segurança pública. A meu ver, é provável, que tirando a Escravidão negra, o regime militar tenha sido uma das maiores desgraças históricas que se abateu sobre este país.
   Pior: e há quem o comemore. Dias atrás centenas de pessoas marcharam pela "Família com Deus pela Liberdade", numa tentativa demente de repetir o movimento ocorrido em Março de 1964, prelúdio civil-empresarial para o golpe militar. O almejado epílogo de tamanha insânia seria uma “intervenção” contra um governo dito “comunista” (o PT, o mesmo governo atrelado às classes conservadoras historicamente enraizadas). Não há proporções para tamanha demência e explicações para tamanho paradoxo.
   Por conta disso, e muitos mais, torna-se nosso dever discutir e rememorar um período tão conturbado e sombrio. É nosso dever eliminar todo e qualquer resquício que dele ainda persista em nossa sociedade, política e instituições. É bom dizer e repetir: DITADURA, NUNCA MAIS!


*Dedico este artigo ao meu falecido bisavô Sylvio Machado, honrado cidadão itarareense, que à sua maneira combateu uma das maiores fatalidades políticas de nossa História recente. 

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